quarta-feira, 23 de setembro de 2009

De Vancouver a Helmand: Colocando um fim à "guerra contra as drogas"

Vancouver, na Colúmbia Britânica, Ciudad Juarez, no norte do México, e a província de Helmand, no sul do Afeganistão, são primas improváveis. Mas juntos, estes três lugares e aqueles como eles provocaram uma mudança notável em um dos debates mais importantes do mundo nos últimos dois anos.

Por décadas, a ideia de legalizar as drogas era apoiada apenas por uma pequena minoria. Mas com a expansão exponencial do mercado global de drogas ilícitas desde o início dos anos 90, os autores de políticas e agências de manutenção da lei estão sobrecarregados pelo desafio representado pela proibição de uma longa lista de drogas. Os mercados se espalharam para lugares que, por décadas, não tinham nenhum problema significativo com drogas, como a China e a Indonésia, enquanto o número de viciados em países como o Irã cresceu enormemente.

Dois desdobramentos significativos estão contribuindo para o aumento repentino dos pedidos para reconsideração da proibição. O primeiro é que as drogas agora estão prejudicando os interesses de segurança ocidentais de longo prazo, especialmente no Afeganistão e no México. O segundo é que a produção está migrando de seus lares tradicionais na Colômbia e no Triângulo Dourado, e se mudando para o coração das áreas de consumo ocidentais, como Canadá, Holanda e Reino Unido.

O problema está se tornando tão dramático que velhos estadistas, altos funcionários da lei, intelectuais e filantropos de todo o mundo estão falando alto e claro: a "Guerra contra as Drogas" é uma política desastrosa, que não atinge nenhuma de suas metas e causa danos imensos à segurança global e à governança onde quer que seja travada.

Eles argumentam que a regulamentação do mercado de drogas pelo Estado reduziria os riscos à saúde e sociais criados pelos narcóticos e gerariam imensas receitas tributárias, que poderiam ser empregadas para absorver quaisquer custos. No momento, os vastos lucros do comércio ilegal de drogas vão para os bolsos do crime organizado e de grupos terroristas.

Os apelos mais urgentes por um repensar vieram da América do Sul, onde figuras respeitáveis, como o ex-presidente do Brasil, Fernando Henrique Cardoso, acentuaram como a guerra às drogas não contribuiu em nada para deter o comércio ilegal de narcóticos, mas resultou em dezenas de milhares de mortos e a perpetuação da cultura das gangues brutais nas áreas mais carentes do continente.

Diego Gambetta, um criminologista da Universidade de Oxford e uma das maiores autoridades mundiais sobre a Máfia siciliana, falou vigorosamente sobre um fim à guerra às drogas. Nos Estados Unidos, o grupo que tem exigido mais fortemente a mudança é o Law Enforcement Against Prohibition, ou LEAP, que é formado por atuais e ex-policiais, incluindo antigos agentes da DEA, a agência federal americana de combate às drogas.

Comentaristas na Europa e nos Estados Unidos acentuam quanto a proibição é responsável pelos milhares de mortos nas guerras da cocaína no México. Os Estados Unidos estão sendo arrastados para a violência à medida que os cartéis mexicanos compram a maioria de suas armas no Texas e em outros Estados.

De modo mais crítico, o Taleban está travando uma batalha eficaz contra as forças da Otan no Afeganistão, porque o valor inflacionado do ópio, causado pela proibição, permite que os insurgentes comprem centenas de milhões de dólares em armamentos a cada ano. Pior, o governo em Cabul que a Otan apoia está repleto de corruptos alimentados pelo lucrativo comércio de narcóticos.

Por falar nisso, o mundo não fará nada enquanto os cartéis colombianos e venezuelanos usam seu imenso poder financeiro para corromper e destruir Estados frágeis do oeste africano, como Serra Leoa e Libéria, ao transformá-los em escalas para exportações de cocaína para a Europa? Os cartéis já eliminaram a governança estável na Guiné-Bissau.

Não há uma tentativa orquestrada por parte do governo Obama ou de outros governos ocidentais de rebater o crescente sentimento a favor de uma reforma da lei das drogas, apesar do presidente ter dito pessoalmente que é contrário à legalização.

Eu conversei com inúmeros políticos que concordam privativamente que, como um deles colocou, "daqui 100 anos nós poderemos olhar para trás e perguntar: que raios estávamos fazendo ao proibir os narcóticos?" Mas eles permanecem hesitantes em expor isso publicamente, por temor da reação negativa que poderia causar.

Os defensores da legalização praticamente venceram o debate moral e intelectual, mas agora enfrentam o argumento mais difícil de todos -o político. É improvável que ele será vencido em Washington, onde a proibição continua desfrutando de apoio poderoso. Mas nós estamos vendo uma erosão do consenso da guerra às drogas em países como Argentina, México, Portugal e Suíça -onde as drogas ou foram descriminalizadas ou legalizadas na prática.

O Canadá enfrenta uma pressão especial -não apenas por ser um dos maiores produtores de maconha do mundo, mas também por ter sido identificado pelo Escritório das Nações Unidas para Drogas e Crimes como um dos centros manufatureiros de drogas sintéticas, como o ecstasy e as metanfetaminas, fornecendo para usuários nos Estados Unidos e em lugares distantes como a Austrália.

Vancouver se transformou em um centro global, exportando maconha e metanfetaminas e importando cocaína destinada aos Estados Unidos e ao mercado local. As mortes ligadas às drogas proliferaram nos últimos 18 meses, provocando uma sensação de crise. A campanha pela legalização da maconha continua crescendo ali, conquistando apoio de políticos por todo o país.

Após 80 anos de guerra contra as drogas, os usuários têm mais acesso a uma maior variedade desses produtos do que nunca. Os preços continuam caindo enquanto os lucros dos narcotraficantes continua subindo. Mas -dados os desdobramentos na América do Sul, Europa e Canadá- talvez estejamos pela primeira vez vendo o surgimento de uma coalizão determinada a desafiar uma política que gera miséria inimaginável entra ano, sai ano.

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